O “Rei dos
Camarotes”, um história cheia de furos
O repórter
Joaquim Carvalho fez – e publicou no Diário do Centro do Mundo – o jornalismo
que a Veja não fez, antes de colocar na sua capa o “Rei dos Camarotes”, com
aquela bobajada que diz. Se o fizesse, ao menos poderia expor as contradições
do dinheiro gasto fácil e a forma como é conseguido.
Se um
pateta como aquele é uma realidade, nada de errado em mostrá-lo. Mas mostrá-lo
sem sua inteireza, gastando um dinheiro que não se sabe como e de onde vem, é
totalmente irresponsável. Torrar R$ 50 mil por “balada”, R$ 200 ou 300 mil por
mês neste exibicionismo é demais para um simples agente de despachantes ou
tomador de carros de inadimplentes - a revista não esclarece se pela via
judicial ou por outros meios.
Se
Alexander Almeida ganhar, líquido, dois mil reais por recuperação, excluídos
custos e impostos - e são carros usados, note – precisaria de 100 a
duzentos carros recuperados por dia só para a conta das boates. Se isso for dez
por cento de tudo o que ganha – e gastando com Ferraris e carros blindados, não
gasta pouco – são dois mil carros por mês ou algo como 40 mil veículos por mês.
Isso é
mais do que o pátio de uma grande montadora comporta.
Jornalismo
deve ser equilibrado, mas jamais acrítico. Senão é só badalação e bajulação.
O Rei do
Camarote na vida real
Na semana
passada, a Veja São Paulo apresentou Alexander Augusto de Almeida, o Rei do
Camarote. Pela reportagem, se soube que ele tem uma Ferrari e gasta até R$ 50
mil numa balada.
Num vídeo
complementar ao texto, postado no Youtube, Alexander Almeida diz quais seriam
os 10 mandamentos do rei do camarote.
É
necessário vestir-se com roupa de gripe, ter um bom carro, comprar champanhe e
se fazer acompanhar por celebridades etc etc, entre outras coisas que se
resumem numa só: ter muito dinheiro para gastar.
Mas, cinco
dias depois da publicação da reportagem e da postagem no Youtube, os
responsáveis pelos quase 4,5 milhões de acessos na internet continuavam sem
saber direito de onde Alexander tira o dinheiro que sustenta seu reinado.
O
site Tijolaço revelou
que Alexander é o que, na gíria do comércio, se chama de
zangão.
Ele tem
uma empresa, a 3A Organização de Despachos, que trabalha para os bancos
“ferrando” as pessoas que compram o carro e não conseguem pagar as prestações.
A 3A de
Alexander localiza o veículo e o encaminha para leilões.
O banco
recupera o que perdeu e Alexander ganha uma comissão. Quanto maior a
inadimplência, melhor para Alexander.
Algumas
empresas oferecem serviço de consultoria para ajudar compradores de automóveis
em dificuldade a não cair nas garras do zangão.
Cobram em
média R$ 1.500 para negociar o refinanciamento da dívida ou entrar com ação.
Uma dessas
empresas é a Acord Consultoria.
No mercado
há cinco anos, ela poderia ocupar qualquer um dos mais de 2 milhões de imóveis
cadastrados na prefeitura de São Paulo, mas funciona em um prédio de três
andares na rua Almirante Calheiros, 312, no Tatuapé, em São Paulo, que pertence
– adivinha a quem? – a Alexander Augusto de Almeida.
O êxito
dos negócios da 3A de Alexander depende basicamente do fracasso da renegociação
ou da ação judicial da Acord. Esta não perde nunca, pois recebe adiantado.
O dono da
Accord, Erick Arlindo, me disse que não sabia que Alexander era o dono do
prédio que ocupa desde janeiro de 2012. “Eu aluguei na Evidence Imóveis, pago
R$ 20 mil por mês, e não conhecia este senhor”, afirmou.
Coincidências
acontecem… Quer outra? A 3A Organização de Despachos é quase vizinha da Accord.
Alexander trabalha em outro prédio que pertence a ele, na rua Apucarana, 1.155,
também no Tatuapé.
Ao
contrário de Alexander, seu senhorio, Erick, é um homem reservado, que não quer
exposição. Ele ocultou a sede da empresa no Google Street View.
A
existência da Accord passaria despercebida não fosse um descuido.
O
empresário que a Veja São Paulo viu gastando R$ 50 mil numa balada devia R$ 55
mil de IPTU do prédio onde está a sede da Accord.
Blogueiros
encontraram uma publicação no Diário Oficial do Município de São Paulo, de
novembro do ano passado, em que a prefeitura cobra o débito.
Na
sexta-feira, não havia mais registro da dívida.
Mas, em
relação ao imóvel onde está a 3A Organização de Despachos, a situação continua
complicada.
O prédio
tem pelo menos 1.000 metros quadrados de área construída, ocupa três andares, e
é usado exclusivamente para atividade comercial.
O IPTU
anual ali seria de, no mínimo, R$ 30.000,00 por ano, levando-se em consideração
o tamanho e o uso comercial.
Mas, no
cadastro do IPTU, o prédio aparece com área construída de 100 metros (um
décimo) e uso residencial. O IPTU anual é R$ 2.790,00.
Se o
cadastro na prefeitura estivesse atualizado, ele pagaria pelo menos dez vezes
mais.
É uma
fraude tributária, mais um descuido revelado que vai para a conta do Rei do
Camarote.
Eu entrei
em contato com dois de seus advogados e com a 3A, mas ele não quis falar. O rei
vai ao programa Pânico no domingo. Houve boatos de que ele fosse uma invenção
dos comediantes. Poderia ser também uma tentativa de “limpar” sua imagem (como
alguém vai limpar a imagem indo ao Pânico é um mistério).
Seu advogado me
garantiu que não, seu cliente era aquilo mesmo — “um cara legal”. O grande
problema é que a história de Alexander é mais cheia de buracos do que um queijo
emmental.
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